Por que a Geração Z está repensando o namoro? Para os mais novos, amar é (ainda) um desafio

Dia dos Namorados é comemorado nesta quinta-feira (12). Data para alguns é sobre o outro, para outros, é sobre si mesmo.

Marcado por declarações de amor, presentes e jantares à luz de velas, 💖o Dia dos Namorados, celebrado nesta quinta (12), passou a ter novos significados – especialmente entre as gerações mais jovens.

Para muitos da geração Z (nascidos entre 1995 e 2010), a compreensão do amor deixou de lado os padrões tradicionais. Para alguns é sobre o outro; para outros, é sobre si mesmo.

Em suma, é a correria do cotidiano e essa questão de a gente se acostumar com a nossa própria solitude. Quando penso que vou ter que demandar um tempo para outra pessoa, e que vou ter que dar uma atenção que às vezes nem consigo dar para mim mesmo, eu não quero namorar.

— Ewerton Duarte, 22 anos

Relacionamentos abertos, poliamor, o conceito de “ficar sério” e até mesmo a escolha consciente de permanecer solteiro tornaram-se maneiras de viver.

Não é que as gerações contemporâneas tenham menos desejo ou vontade de se engajar em relações, eles têm menos habilidades e recursos para enfrentar os desafios que representam o convívio com o outro e o desejo do outro como parte de um processo da dualidade da relação – e não só a sua vontade como soberana.

— Thiago Blanco, psiquiatra

Buscando amar 💞

Segundo especialistas ouvidos a busca pelo amor é uma demanda primária do ser humano. Na psicologia existe uma teoria de que o ser humano é dirigido para atender duas necessidades fundamentais, a de se sentir amado e a de ser reconhecido ou sentir-se competente.

Para Ewerton Duarte, 22 anos, estudante universitário, a decisão de não namorar é resultado de uma combinação de fatores que refletem tanto sua realidade pessoal quanto a da sua geração.

Realmente acho que as pessoas da minha faixa etária estão cada vez menos interessadas em namorar.

— Ewerton Duarte, estudante

O psiquiatra Thiago Blanco explica que nas etapas iniciais do desenvolvimento, ainda quando bebê, o ser humano não deve passar por nenhuma privação de segurança e de afeto. Por outro lado, passar por frustações ao longo do desenvolvimento é uma necessidade fundamental para a construção de uma identidade que tenha resistência a isso.

A escolha de permanecer solteiro é, acima de tudo, uma forma de autocuidado. O universitário Ewerton Duarte, de Brasília, diz que a prioridade de muitos jovens está voltada para os estudos, a carreira e o entretenimento pessoal.

‘Melhor só do que mal acompanhado’

Pessoa desenha coração em vidro de carro, em imagem ilustrativa — Foto: Getty Images

Pessoa desenha coração em vidro de carro, em imagem ilustrativa — Foto: Getty Images

Em tempos em que os relacionamentos parecem cada vez mais moldados por algoritmos e aplicativos, Rangel de Oliveira segue na contramão. O contador de 22 anos, conta que o momento é de foco em outras prioridades como:

  • “Estabilidade profissional
  • Conquista de um espaço próprio
  • Realização de metas pessoais “

Mesmo que alcance todos os objetivos que considera essenciais para iniciar uma relação, Rangel acredita que ainda não conseguiria viver um relacionamento. “Ficar com aquela pessoa por toda a vida e diariamente, ter que falar para onde e quando vou e, basicamente, viver um pela vida do outro, essa ideia nunca me agradou e não me agrada ainda”, diz o jovem.

Sobre a influência da internet e dos aplicativos de relacionamento, Rangel é pragmático. “Acredito que tanto os apps quanto a vida cotidiana podem ser formas de encontrar alguém, caso esteja procurando“, destaca.

Para Juan Espiñeira, produtor audiovisual, a internet escancara diversas formas de relacionamentos amorosos. “Os apps de relacionamento já são parte do cotidiano, não há como negar, mas mais do que a maneira de ver um namoro, é a maneira de experienciar relações que eles proporcionam”, diz o jovem de 27 anos.

O tempo é um dos principais fatores que o levaram Espiñeira a não estar em um relacionamento.

Tenho 27 anos e uma vida e uma carreira para construir, então não consigo me ver em meio a um relacionamento neste momento. Já são quatro anos solteiro e me acostumei tão bem com a minha companhia, que o processo de adicionar outra pessoa à minha rotina e atividades não me atrai.

— Juan Espiñeira, produtor audiovisual

Também com 27 anos, a técnica de enfermagem Julia de Oliveira decidiu dar uma pausa nos relacionamentos amorosos. “Passei muitos anos dentro de relacionamentos longos, sentia falta de me ver e estar sozinha“, diz Julia.

A decisão, segundo ela, não foi motivada por decepções amorosas, mas por uma necessidade pessoal de autoconhecimento e liberdade.

É um momento meu, de me priorizar, de entender quem sou fora de um relacionamento.

— Júlia Oliveira, 27 anos

Julia também observa como a internet e os aplicativos de relacionamento têm mudado a forma como as pessoas encaram o namoro. Para ela, a velocidade com que os relacionamentos se iniciam e terminam nas redes sociais pode dificultar conexões mais profundas.

“São muitas informações novas o tempo todo, tornando as coisas muito superficiais. É tudo muito rápido, muito descartável. Isso me fez querer desacelerar e olhar mais para dentro”, diz a técnica de enfermagem.

Segundo o psiquiatra Thiago Blanco, as novas gerações têm expectativas diferentes em relação à construção social, especialmente nas estruturas e formas de amar. “Elas conseguem construir uma imagem de maior liberdade nesse campo. O senso de justiça é bastante fortalecido, mas também há uma liberdade maior na experimentação do próprio corpo e na abertura para questões de gênero”, explica.

No geral, há uma tendência mais libertária, o que impacta os modelos familiares, tornando-os mais livres em relação às relações e experiências individuais, sexuais e sociais, promovendo uma maior aceitação da diversidade.

— Thiago Blanco, psiquiatra

Amores líquidos não valem o meu tempo ❓

A escolha de permanecer solteiro, como demonstrado nos relatos, se alinha diretamente ao conceito de amores líquidos, proposto pelo filósofo Zygmunt Bauman.

📌 Esse conceito descreve uma sociedade em que os vínculos afetivos se tornaram mais frágeis, instáveis e marcados pela fluidez — ou seja, relações que se formam e se desfazem com facilidade, sem o compromisso duradouro que caracterizava os relacionamentos em tempos anteriores.

Características

  • Instabilidade: Relações não têm garantia de durabilidade; são facilmente descartáveis.
  • Individualismo: A busca pela satisfação pessoal prevalece sobre o compromisso com o outro.
  • Medo do Compromisso: Há receio de criar vínculos profundos por causa da imprevisibilidade e da possibilidade de sofrer.
  • Consumo de Relações: Pessoas tratam relações como produtos: descartam quando deixam de “servir”.
  • Virtualidade: A tecnologia e as redes sociais potencializam interações superficiais e passageiras.

Impactos sociais e pessoais

  • Solidão: Apesar de conectadas, as pessoas sentem-se isoladas por não desenvolverem laços profundos.
  • Ansiedade Relacional: A incerteza sobre a reciprocidade causa insegurança e tensão.
  • Desumanização: Relações são pautadas mais pelo utilitarismo do que pelo afeto genuíno.

Contexto da Modernidade Líquida

  • Os “amores líquidos” são reflexo da modernidade líquida, em que tudo é transitório, fluido e efêmero.
  • Valores tradicionais como estabilidade e fidelidade são substituídos pela busca constante por novidades e satisfação instantânea.

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